sexta-feira, 2 de dezembro de 2016

TRAGÉDIA ANUNCIADA É CRIME


Estamos todos comovidos chorando a morte de rapazes, jovens jogadores de futebol, dirigentes da Chapecoense e de jornalistas esportivos. Se pensar no sofrimento de uma família enlutada já dói, multiplicar isto por 71 dilacera o coração de qualquer pessoa com sentimentos. Se somarmos a isto que o pesar é por atletas e uma instituição que se tornou orgulho do futebol catarinense e colocou o nome de Santa Catarina no cenário do futebol sul americano, chegam a ser tratados como heróis. Heróis mortos. Mas tudo isso já sabemos. Quantas vezes já nos emocionamos nas últimas horas assistindo esta tragédia pela tevê ou nas redes sociais?... 

Nosso coração chora e acaba fazendo isto verter pelos olhos. Porém, o que mais dói é verificar que a versão que se anunciava lá atrás como especulação a ser investigada, agora se desnuda como a mais pura e absurda verdade. Não foi uma simples tragédia. Foi um crime. Um crime de irresponsabilidade. Muito antes das investigações oficiais já se sabe o que mostrava-se óbvio: 71 pessoas morreram por absoluta falta de seriedade de uma empresa de fretamento aéreo chamada Lamia. Isso aprofunda a tristeza. Joga-a ao mais profundo poço, porque agora sabemos que todas essas mortes eram plenamente evitáveis. Elas não precisavam acontecer.

Aqueles meninos jogadores de futebol que vestiam verde, seus dirigentes que tão bem comandavam a Chapecoense dentro e fora de campo e todos os jornalistas esportivos que nos encantavam com suas reportagens, narrações e comentários foram mortos pela irresponsabilidade, ganância e total incompetência de uma empresa de fretamento aéreo. E aí o choro transforma-se em revolta.

Desde as primeiras horas do trágico crime, já se falava em falta de combustível. Logo em seguida, pilotos comentavam o tipo de aeronave que tinha autonomia de tanque mal e mal para fazer o trajeto origem-destino daquele voo. O plano de voo era totalmente irregular. O piloto era também sócio da empresa safada. Depois chegaram informações de que há sanções pesadas para piloto e empresa que provocam uma “emergência” dessas, ainda que conseguissem pousar. Os interesses comerciais falaram mais alto do que 71 vidas.

Chapecó, Santa Catarina e o futebol brasileiro continuarão chorando as mortes dos representantes do Verdão do Oeste. A crônica esportiva e os amantes do futebol continuarão chorando a perda daqueles que levavam alegria a todos através do esporte. O mundo esportivo continuará atônito com tanto sofrimento evitável. Mas a verdade dos fatos mostra que mais do que nosso choro, mais do que a comoção nacional, é preciso ficar indignado com o crime cometido pela empresa Lamia.

Eles mataram aqueles meninos artistas da bola e seus protetores. Eles mataram. Um crime que deve ser punido com todo rigor, pois não é possível que outros morram, no futuro, por irresponsabilidade e ganância. Enquanto a cidade de Chapecó vela seus mortos, estará pensando que nada disso seria necessário, que nada disso seria preciso. 

Já soube de aviões comerciais, de carreira, que sofreram acidentes... nunca soube de um que tenha sido por falta de combustível. Acidentes só podem ser assim chamados quando o imprevisível muda uma trajetória, o totalmente inusitado modifica um resultado. Não foi o que aconteceu com o avião que levava a Chapecoense. Não foi um acidente aéreo comum. Foi assassinato! A troca da segurança por ganhos financeiros a mais.

De toda tragédia, no entanto, por mais doída que seja, é preciso tentar buscar algum ensinamento, alguma lição. Assim como depois da tragédia que vitimou mais de 200 vidas em uma casa noturna da gaúcha cidade de Santa Maria. No meu modesto ponto de vista, o ensinamento a ser aprendido agora é o cuidado que devemos ter quando contratamos um prestador de serviço – e não só para voar. Milhares de ônibus fretados cortam nossas rodovias todos os dias. Qual a condição, a responsabilidade, o modus operandi e a idoneidade dessas empresas?  Milhões de crianças são transportadas todos os dias por vans escolares particulares. Quem está prestando este serviço para nossas crianças?


Contratar serviços por preço, camaradagem ou falta de pesquisa pode fazer o barato sair caro. Enquanto não formos mais criteriosos, mais investigativos, mais conscientes em nossas escolhas, poderemos colocar nossas vidas e a vida das nossas pessoas mais queridas em risco. Pense nisso.


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