sábado, 29 de março de 2008

QUASE SEM QUERER - Legião Urbana

Tenho andado distraído
Impaciente e indeciso
E ainda estou confuso
Só que agora é diferente:
Estou tão tranquilo e tão contente

Quantas chances disperdicei
Quando o que eu mais queria
Era provar pra todo mundo
Que eu não precisava
Provar nada pra ninguém.

Me fiz em mil pedaços
Pra você juntar
E queria sempre achar
Explicação pro que sentia

Como um anjo caído
Fiz questão de esquecer
Que mentir pra si mesmo
É sempre a pior mentira

Mas não sou mais tão criança
A ponto de saber tudo

Já não me preocupo
Se eu não sei porquê
Às vezes o que eu vejo quase ninguém vê
E eu sei que você sabe
Quase sem querer
Que eu vejo o mesmo que você

Tão correto e tão bonito:
O infinito é realmente
Um dos deuses mais lindos

Sei que às vezes uso
Palavras repetidas
Mas quais são as palavras
Que nunca são ditas?

Me disseram que você estava chorando
E foi então que percebi
Como lhe quero tanto

Já não me preocupo
Se eu não sei porquê
Às vezes o que eu vejo quase ninguém vê
E eu sei que você sabe
Quase sem querer
Que eu vejo o mesmo que você.

- - - - - - -

A letra desta música é muito legal. Mas algumas frases se destacam: "E ainda estou confuso /
Só que agora é diferente: / Estou tão tranquilo e tão contente" dá a idéia de que não precisamos ter certeza para estarmos bem. Por vezes a indecisão e a confusão podem representar a felicidade. A busca pela felicidade, aliás, é uma eterna confusão. Mas se estamos felizes neste momento, apesar da indecisão e confusão,é o que importa. Afinal, não há porque nem como ter certeza. A dúvida impele à busca. A dádiva da dúvida e a dívida do óbvio.

Querer achar explicação para o que sente é uma tolice que aprendemos com o tempo. Sentimento é emoção, explicação é razão. Não há como racionalizar a emoção. Sentir é viver, explicar é sobreviver. Prefira viver!

E entre outras frases interessantes, embora mais óbvias, há uma que gosto muito: "Já não me preocupo / Se eu não sei porquê / Às vezes o que eu vejo quase ninguém vê"... A sociedade se acostumou a fazer o que tem de ser feito e querem que todos façam igual. Não conseguem enxergar que a vida é uma eterna busca e que a soma de momentos felizes é que talvez possa ser chamada de felicidade. Mas para isso há de se viver. Porém, a normalidade quer que você seja feliz com o que tem, com o que o mundo lhe deu, sem questionar muito, sem buscar novas experiências. E se sua busca envolve mexer em algumas estruturas mais rígidas da sociedade (como o próprio casamento, ou família), aí mesmo é que tentam lhe convencer a ser "meio-feliz". Parece que a imensa maioria não vê que aceitar uma felicidade meia-boca é se enganar. Cessar a busca é negar a vida. Mas pensar assim, é dar murro em ponta de faca. Então, melhor nem se preocupar se quase ninguém consegue ver o que eu vejo... é uma pena. Continuarei dando meus vôos de Fernão Capelo Gaivota enquanto a grande maioria luta pelos restos de peixe podre jogados pelos pescadores.

Dando o toque: os poemas no livro

Os poemas publicados abaixo fazem parte do livro Concreta Mente Abstrata, de Fabrício Wolff, lançado em 2007 pela Editora Cultura em Movimento. Ele traz 41 poemas e oito obras de artistas plásticos. Exemplares podem ser encontrados no Kunsgarten, anexo ao Museu da Cerveja, na praça Biergarten, Blumenau.

RESPOSTAS

Não procure saber de onde vem a vida
Pois ela não vem
Está presente

A vida está no seu olhar
No seu jeito louco de amar
Na sua sede de saber

A vida está no seu caminho
Na sua última taça de vinho
No seu ponto de interrogação

A vida está no seu mundo
No seu embriagado sono profundo
Nas suas dúvidas sobre si mesma

A vida está em todo o lugar
Nas manchas do lençol da cama
Assim como a morte também está

Não procure saber onde vem a morte
Pois ela não vem
Está presente.

INSÔNIA

Dia de sol... dia claro
Na noite a lua cheia chegou
E eu sentado (talvez drogado)
Passei a madrugada a contar estrelas

Você, sem entender-me
Deixou-me só com o universo
Um louco abandonado
Desvendando os mistérios da escuridão

E viajei pelas constelações
Pisei no lado escuro da lua
Alienígena desvairado
Jogado no sofá da sala

Mas a noite é tão bonita
E você é tão bonita
Que me deixa embriagado
E já não posso mais dormir.

DEU(S) PRA ENTENDER?

Quem é Deus?
O que é Deus?
Existirá algum Deus?

Deus é palavra de quatro letras
Deus é som
É imagem
É pintura
Deus é energia pura

Deus é demagogia da igreja
Deus é natureza
É tempestade
É uma risada
Deus é tudo... e nada

Deus é espaço infinito
Deus é quadro
É arte
É sorte
Deus é vida... e morte

Deus é algo que se escreve com letra maiúscula
Sem ao menos se saber porquê
Deus é você
Não à sua imagem e semelhança
Deus é você mesmo

Mas... você acredita em si mesmo?

sábado, 15 de março de 2008

VAZIO

Estou vazio mais uma vez
Vazio de vez
De voz
E só

Sou pó
Poeira no mundo
Esquecida no fundo
De um baú qualquer

Nem o grito na garganta, sequer
Despido de esperança
Vingança
Ou amor

Há dor
Infinita dor perdida no espaço
E não sei mais o que faço
Ou digo

Momento de perigo
É o da reflexão
Pois nada resta ao vazio, senão
Desaparecer.

Religião e igrejas, a hipocrisia

Não. Definitivamente não discuto mais religião... nem converso sobre. Tenho certeza que minha opinião, se a falasse, assustaria as pessoas. Assustaria até os que me conhecem há mais tempo. Provavelmente afastaria a maioria de mim. E os que relevassem, ainda assim ficariam “decepcionados”.

Desde muito cedo, após estudar nove anos em colégio de padres, tenho muitas dúvidas sobre o mais precioso “cálice sagrado” dos cristãos: a existência de Deus e o papel de Jesus Cristo nisso tudo. O problema é que já não sou mais um jovem de 11, 14 ou 17 anos que estuda num colégio de padres e põe em dúvida o que pregam/pregavam e o que fazem/faziam. O amadurecimento, o passar do tempo, me fez ver que a religião, principalmente as cristãs, é mais uma forma de dominação. Tal qual os bárbaros de outrora; tal qual os políticos de hoje.

Todo dominador tem um objetivo claro: que cada indivíduo, que eu, que você, pense como ele. Se pensar assim, serve aos seus propósitos, aos propósitos do dominador. Se pensar diferente, se discordar, acaba sendo execrado. Se não pelo dominador, pela casta que ele habilmente criou. Óbvio que quando se fala de dominador não se fala de uma pessoa, se fala de um sistema.

Não vou discorrer aqui sobre a história da igreja cristã, desde seus primórdios, logo após a morte de Cristo. Nem tenho conhecimento tão profundo para dizer sobre, mas li muito sobre a história marginal, a não oficial. A oficial, claro, todos conhecem. Da religião, por exemplo, está na Bíblia – especialmente no Novo Testamento, contado após a morte de Cristo. Só os vencedores contam a história. Ou são os sobreviventes (das batalhas da antigüidade) ou conquistaram tal poder de domínio que tem nas mãos o poder de comunicar a sua verdade (tempos atuais). “Verdade”, que palavra maravilhosa... só ela dá um texto inteiro, mas não será agora.

Também não quero entrar em particularidades sobre a história do próprio Cristo (segundo Nietsche, o único cristão existente até hoje na história terrena). Os demais, segundo ele e escritos banidos da história antiga, usaram da sua palavra para investirem-se de poder (ler história é muito interessante: quando se vê o momento político-histórico em que Cristo surgiu, numa época de mil profetas, submissão do clero à dominação romana, desesperança do povo judeu, etc, etc, etc, pode imaginar porque ele {minúsculo mesmo, porque por maior que tenha sido era um homem de carne e osso} foi o que foi – e o digo com a mais verdadeira admiração) acabou por ser o “prato perfeito” para ser usado, post mortem, principalmente por São Paulo, então apóstolo, criador da igreja católica.

Mas também não quero me prender às histórias de Cristo. Penso que cada um deve procurar informações sobre aquilo que lhes pode interessar. Porém, não posso furtar-me a dizer que não era milagroso (logo, não existiram milagres, exceto nas metáforas e analogias da Bíblia que muitos lêem cegamente como verdade nua e crua, sem interpretação , e no interesse vil da igreja, cujo mistério e anormalidade dos milagres mantém muitos fiéis cegos em devoção). Não, também não quero discorrer sobre a admiração que tenho em um homem simples, humilde porém inteligentíssimo, que é o único cristão não pelo nome, mas por ter vivido o que pregou. Sem máscaras, sem meias-palavras. Viveu e morreu por uma causa (como muitos mártires que vieram depois. Só no Brasil podemos citar Tiradentes e Chico Mendes – ainda vou ser muito criticado pela citação, sem comparação). Provavelmente pela melhor das causas: o amor. Não foi compreendido, não o seria na época, não deveria ser e não o seria hoje.

Lembro agora, deixando de tentar me aprofundar, de Renato Russo (Legião Urbana para os que não viveram os anos 80-90), quando disse, uma vez, não nas fantásticas letras de suas músicas, mas numa entrevista, que o ser humano não precisa de revoluções políticas ou ideológicas. Antes de tudo, precisa de uma revolução humana (no sentido mais puro da palavra humana, vista como sentimento). Uma revolução dos corações, da alma.

Pois bem: a teoria em que acredito é que Jesus foi um homem de carne e osso, sem milagres, nem santificação, nem ressurreição; mas um ser humano admirável. Viveu o que pregava (coisa que, sinceramente, não conseguimos fazer), tinha um carisma extraordinário e fez apóstolos e demais seguidores – a maioria desesperados, sem norte – viverem de verdade a sua palavra pelo exemplo que dava. Outro, estou pra ver.

Santificado foi pela igreja (engendrada por São Paulo após sua morte como forma de conquistar a simpatia e certo poder junto ao clero pré-estabelecido e pré-Jesus e ao governo romano – afagou os seguidores, domou-os a ponto de não criarem problemas futuros para os dois níveis de poder e pasteurizou a palavra conquistando respeito e poder) e deve estar – se é que existe vida após a morte, outra coisa que ponho grande dúvida – se debatendo em cinzas até hoje por todos os falsos profetas cristãos que tiram proveito, na carona do esperto Paulo, até hoje das pessoas que crêem. Disse ele (sempre em letra minúscula, mas no maior respeito ao exemplo de ser humano) para amar uns aos outros, para dar aos pobres, para dar guarita aos pecadores. Basicamente isso. E o que se vê? Exploração da crença medíocre. Jesus acolhia os “pecadores” (palavras do Novo Testamento, escrito por homens e não por ele), a igreja os aponta, os condena e só os salva diante da crença, da submissão. Ainda que as igrejas cristãs – e aí não verso apenas sobre a católica ou a luterana, mas todas que dizem pregar a palavra dele – executem trabalhos sociais muitas vezes favorecendo os mais necessitados – de posses ou de mente, que alguns diriam espírito – a cobrança por este trabalho (dízimo, centésimo, milésimo... seja lá como chamem) é a prova da não cristandade. Ou alguma vez alguém leu, seja nos textos oficiais ou renegados, que Jesus tenha cobrado algo para fazer o bem? Se realmente pudesse reviver, ele se envergonharia da semente que tentou plantar um dia.

Hoje o amor é condicional, totalmente ao contrário do que ele pregava. Se não pagar a mensalidade para a igreja, não tem direito às “bênçãos” oficiais. Assim como Nietsche escreveu um livro sobre as igrejas, religiões e Cristo, daria para fazê-lo também. Mas minha idéia inicial nem era essa – embora tenha me alongado no tema, por ser apaixonante. Era dizer da minha descrença (e não chamo incredulidade porque um dia, quando criança, acreditei, ou devo ter acreditado) na total hipocresia chamada igreja. As religiões cristãs fazem de nós pecadores, devedores morais, nada perto do poço de virtudes que um “seguidor” deve ter – e eles, padres, pastores, bispos, papas, juram ter...

Nos tiram – de alguns pelo menos tentam tirar, pois onde há consciência há resistência – o único atributo que nos diferencia dos demais animais: o livre arbítrio (alíás, grande jogada do sistema enquanto sociedade: incutir dogmas para que nós mesmos nos policiemos e cerceemos, pregando livre arbítrio quando erramos para nos punir e o tirando quando resolvemos agir ou simplesmente pensar à margem daquilo que deveríamos) quando nos personificam como “alguém da sociedade”, tal qual uma manada, que deve seguir seu rumo conforme os tocadores de boiada ordenam.

E aí, depois desta volta toda num texto que pretendia mais curto, fecho o pensamento do esquema da dominação, que propunha mais acima: me recuso a ser um boi, um irracional, um sem opinião. Sempre me recusei que me digam o que posso ou devo fazer. Ainda que como sobrevivente trabalhador do cotidiano tenha que aceitar muitas coisas (e nessas horas é melhor nem pensar), em alguns assuntos ainda podemos optar, ser nós mesmos... ainda que não devamos falar para não assustar a grande maioria social (se eu colocasse social-mecânica-crente ficaria muito pesado?). Opto e defendo a diversidade de opiniões. Respeito quem acredita, ainda que muitos simplesmente cumpram o jogo para o qual foram doutrinados; acreditam sem sequer saber porquê – e, claro, sem nem se perguntar. Respeito os que têm suas religiões, inclusive as cristãs. Respeito as pessoas. Não me peçam para respeitar as igrejas. Porém, não respeito nem posso concordar com a hipocresia que cerca este mundo.

Gostaria muito que houvesse alguém que me provasse o contrário, mas só vejo “pregadores” – não necessariamente investidos (padres, pastores...) com as cuecas na mão. Nunca conseguirão seguir a bíblia que defendem. E me encontro num momento da vida, aos 42 anos, que esta hipocresia chega a me enojar.

Além do mais, quer saber? Se alguém seguisse todos os bons exemplos da bíblia teria uma vida pra lá de chata, enfadonha, triste mesmo... Prefiro viver.