quinta-feira, 24 de abril de 2008

INFINITA HIGHWAY - Engs. do Hawaii

Você me faz correr demais
Os riscos desta highway
Você me faz correr atrás
Do horizonte desta highway

Ninguém por perto, silêncio no deserto,
Deserta highway
Estamos sós e nenhum de nós
Sabe exatamente onde vai parar

Mas não precisamos saber pra onde vamos

Nós só precisamos ir
Não queremos ter o que não temos
Nós só queremos viver

Sem motivos nem objetivos
Estamos vivos e isto é tudo
É sobretudo a lei
Dessa infinita highway

Quando eu vivia e morria na cidade
Eu não tinha nada, nada a temer
Mas eu tinha medo, medo desta estrada
Olhe só! Veja você

Quando eu vivia e morria na cidade
Eu tinha de tudo, tudo ao meu redor
Mas tudo que eu sentia era que algo me faltava
E, à noite, eu acordava banhado em suor

Não queremos lembrar o que esquecemos
Nós só queremos viver
Não queremos aprender o que sabemos
Não queremos nem saber

Sem motivos, nem objetivos
Estamos vivos e é só
Só obedecemos a lei
Da infinita highway

Escute garota, o vento canta uma canção
Dessas que a gente nunca canta sem razão
Me diga, garota: "Será a estrada uma prisão?"
Eu acho que sim, você finge que não

Mas nem por isso ficaremos parados
Com a cabeça nas nuvens e os pés no chão
Tudo bem, garota, não adianta mesmo ser livre
Se tanta gente vive sem ter como viver

Estamos sós e nenhum de nós
Sabe onde quer chegar
Estamos vivos sem motivos
Mas que motivos temos pra estar?

Atrás de palavras escondidas
Nas entrelinhas do horizonte
Desta highway...
Silenciosa highway

Eu vejo um horizonte trêmulo
Eu tenho os olhos úmidos
Eu posso estar completamente enganado
Posso estar correndo pro lado errado
Mas a dúvida é o preço da pureza
E é inútil ter certeza

Eu vejo as placas dizendo

"Não corra" "Não morra", "Não fume"
Eu vejo as placas cortando o horizonte

Elas parecem facas de dois gumes

Minha vida é tão confusa quanto a América Central
Por isso não me acuse de ser irracional
Escute garota, façamos um trato:
Você desliga o telefone se eu ficar muito abstrato

Eu posso ser um Beatle

Um beatnik, ou um bitolado
Mas eu não sou ator
Eu não tô à toa do teu lado

Por isso garota façamos um pacto:
Não usar a highway pra causar impacto
Cento e dez, cento e vinte, cento e sessenta

Só pra ver até quando
O motor aguenta

Na boca, em vez de um beijo,
Um chiclete de menta
E a sombra de um sorriso que eu deixei
Numa das curvas da highway

- - - - - - - -

Aí está outra letra fantástica, filosófica, das bandas reveladas nos anos 80. Humberto Gessinger dos Engenheiros do Hawaii, meu conterrâneo, foi muito feliz nesta letra, mas algumas frases são "avassaladoras", na minha opinião.

Acho que pra começar a tentar entender o que a letra quer dizer, temos que trocar a palavra "highway" e "estrada", por vida, na amplitude de experiências que uma vida pode proporcionar se resolvermos viver - e não simplesmente deixar ela passar.

Já no início da letra "correr demais os riscos desta highway" e "correr atrás do horizonte desta highway" são momentos emblemáticos. Vida sem risco não é vida. É tv com controle remoto na mão. Já o horizonte é aquele lugar onde nunca se chega, sempre está mais a frente, a ser alcançado. É como o que denominam "felicidade". Se quer, a gente busca, mas quando chega, o horizonte está mais adiante. Não há fim nesta busca.

(meu, esta letra é grande pra caramba e já vi que vou escrever um monte. Isso vai ficar compriiido...)

Esta parte seguinte é muito clara, nem precisa de comentários, mas há de se enxergá-la com clareza: “Estamos sós e nenhum de nós / Sabe exatamente onde vai parar / Mas não precisamos saber pra onde vamos Nós só precisamos ir / Não queremos ter o que não temos / Nós só queremos viver”. A vida não é algo automatizado, previsível... não para quem quer viver de verdade. É quase como um vôo cego, com perigos, riscos e o benefício daquilo que aprendemos e vivemos no caminho. Ou nos jogamos no sofá, com a tv e o controle.

E aí vem: “Sem motivos nem objetivos / Estamos vivos e isto é tudo / É sobretudo a lei / Dessa infinita highway”. Não importa porque estamos aqui e para onde vamos. O caso é que estamos aqui... isso é a vida. E só.

Mas estas frases a seguir merecem atenção especial pelas entrelinhas... “Quando eu vivia e morria na cidade / Eu não tinha nada, nada a temer / Mas eu tinha medo, medo desta estrada...” Viver e morrer na cidade. Sacou? Estar ali e morrer por odiar a vida que se leva, regrada, aceita. Uma vida boa (posses, talvez, segurança...), nada a temer. Mas tinha medo da estrada, tinha medo da vida em si, do que ela pode representar e ele, em sua vida-morte social não tinha coragem de experimentar” (e quando digo ele, digo cada um de nós, claro).

E na estrofe seguinte, corroborando a interpretação: “Eu tinha de tudo, tudo ao meu redor / Mas tudo que eu sentia era que algo me faltava...” Bingo! Sempre faltará algo àqueles que questionam, que preferem a dádiva da dúvida à dívida do óbvio. O horizonte nunca está no lugar, parado.

Cara, é só deixar a cabeça viajar por esta letra... daria pra ficar escrevendo alhures sobre ela. Mas aí vem uma outra frase simples, quase bobinha para quem escuta a música sem enxergar a letra: “Me diga, garota / Será a estrada uma prisão? / Eu acho que sim / você finge que não”. Caracas! Nem todo mundo entende aqueles que preferem as dúvidas às respostas. Esta é uma minoria. E ele pergunta: a vida é uma prisão? Acho que sim... a garota finge que não. Talvez finja porque se acostumou à vidinha normal de quase todos. Ou talvez nem finja, simplesmente não tenha nível para compreender a filosofia da vida. Mas quem prefere a dúvida, não concebe que os outros não enxerguem, então acha que estão fingindo não ver.

E para acabar (porque toda a letra merece ser desnudada, mas não chegarei a tanto): “Eu vejo um horizonte trêmulo / Eu tenho os olhos úmidos”. A felicidade/horizonte não chega nunca para quem busca mais e isso faz com que sejamos, de certa forma, infelizes (olhos úmidos) em nosso âmago.

E aqui a nossa amiga incerteza, a dúvida: “Eu posso estar completamente enganado / Posso estar correndo pro lado errado”... e para finalizar esta leitura com chave de ouro: “Mas a dúvida é o preço da pureza / E é inútil ter certeza”. A dúvida é o preço da pureza porque nos faz buscar mais, duvidar mais, adquirir mais experiências e ver que não há pureza... e de que adianta ter certeza? Talvez só nos feche os olhos e nos amoleça para não mais buscar. Fechei contigo, Gessinger!


E o recado final: 110, 120, 160... pisar fundo na busca, só pra ver até quando o motor aguenta. Afinal, viver é preciso; vegetar não o é.



5 comentários:

Thiago Floriano disse...

se for ver bem o número de letras brilhantes dessa época, tens conteúdo pra muito tempo no blog... vamos lá... se o horizonte estiver trêmulo, ajustemos o tripé e sigamos em frente... abraço!

Anônimo disse...

“Mas a dúvida é o preço da pureza / E é inútil ter certeza”. sempre lembro dessa frase quando leio a sua, da dádiva da dúvida. E para fugir do imposto pela sociedade, ele ainda enfrente o maior pilar de nossa sociedade com "na boca em vez de um beijo, um chiclé de menta", e a sombra desses sorrisos que todos nós deixamos em alguma das curvas da highway...

Marina Melz disse...

ahá uhú e viva o Humertão.

de todas as frases e músicas dele, que não são poucas, não posso deixar de citar a minha predileta "toda vez que falta luz o invisível nos salta aos olhos".

Unknown disse...

Grande Fabricio, com certeza nós da banda Tribus da Lua ficamos muito gratos por vc ter cedido esse poema (agora música)para incluir em nosso repertório que irá fazer parte de nossa histório cd Tribus da Lua..
grande abraço e quem sabe um dia desse não possamos sentar em uma mesa de bar novamente e falar o quanto sucesso esta fazendo a música o eterno balé das ondas ... abraços..

Sabrina Castro disse...

eu também considero a highway a grade estrada da vida; mas isso já não é mais novidade! gostei muito do seu blog;]
as músicas desse período, dizem muito mesmo...essa em especial*