domingo, 20 de julho de 2014

COMO PERDER UM HEXA


Para quem gosta de futebol, como eu, sempre há explicações razoáveis para perder uma Copa do Mundo, mesmo que a derrota seja de uma seleção penta campeã como a brasileira. Neste artigo resolvi declinar as três razões que, acredito, tenham sido principais para o Brasil ter perdido a Copa do Mundo em casa. O interessante é que duas delas são fatores psicológicos. E o outro fator também é extracampo, embora reflita diretamente no resultado do desempenho dentro das quatro linhas. Do trio de razões, excluo fatos óbvios como a cultura de organização (não há como comparar, por exemplo, Alemanha e Brasil neste quesito) ou mesmo a competência futebolística nos gramados. Se considerasse isto, teria que concordar que fomos longe demais. Chile apresentou um futebol à altura do nosso; Colômbia até melhor. Holanda e Alemanha mostraram o quanto seu futebol era melhor do que o do Brasil. A Argentina se nivelou ao Brasil. Ambas as seleções, assim como Portugal, apostaram todas as suas fichas em um salvador da pátria. Só que Sassá Mutema era personagem de novela. A vida real, inclusive nos gramados, é bem diferente.


Antes de explicitar as três razões que considero as principais pela derrota, abro um parênteses para a chatice dos teóricos da conspiração. Conseguem ser tão doentes que primeiro acreditavam que a Copa estava comprada pelo Brasil. Desfilavam argumentos para isso. A nossa seleção seria campeã de qualquer jeito. Já estava tudo “acertado”. Quando a Alemanha enfiou aquela goleada histórica, no mesmo momento esses mesmos doentes mudaram de argumento, mas continuaram defendendo a teoria da conspiração. A total falta de coerência e sentido desses ‘teóricos’ passou a dizer que estava tudo acertado para que o Brasil não ganhasse a Copa. Tanto é que Neymar nem se machucou de verdade. Tudo era uma farsa. Há uma explicação psicológica para essas pessoas que enxergam conspiração em tudo: a fantasia é que os permite suportar a chata vida real que enfrentam no dia a dia.

Mas vamos ao centro da ideia deste texto: para mim, a seleção brasileira começou a perder a Copa do Mundo na convocação do técnico Felipão. Não que ele não tenha chamado muitos dos melhores jogadores brasileiros em atividade. Mas cometeu o grave erro de convocar muitos volantes e somente um armador (Oscar) para o meio campo. O Brasil era defensivo por natureza. Um time sem saída de qualidade para o ataque. Uma equipe que não conseguia fazer a bola chegar com qualidade lá na frente. Tanto é que Neymar não chegou a brilhar e Fred se queimou. Quando a seleção tentou atacar, sem mais ofensiva, tomou 7. Não havia armação de jogadas. Era um time sem tática e sem inspiração. Um erro que começou na convocação. Deu no que deu.

O segundo ponto crucial da derrota também nasceu antes da Copa e permaneceu durante a competição: éramos campeões por antecipação. Sempre fui fã de Luiz Felipe Scolari como técnico. Ele foi o comandante de uma das melhores épocas do meu Grêmio e conseguiu fazer o Criciúma, por exemplo, ser campeão da Copa do Brasil. Sempre tirou leite de pedras; fez campeãs equipes como jogadores de nível técnico médio. Porém a postura nas entrevistas, mesmo antes da Copa, dizendo que o Brasil seria campeão, que era uma obrigação natural ganhar a Copa em casa, foi prejudicial à equipe. Ele, Parreira e toda a comissão técnica colocaram responsabilidade extra sobre os ombros dos jogadores. O país acreditou, a torcida acreditou, mas não havia futebol para tanta certeza de título. Esta responsabilidade extra se transformou em pressão e bons jogadores em seus clubes não conseguiram render nem perto do que estão acostumados. Aliás, a seleção não foi sombra do que jogou na Copa das Confederações.

Minha terceira razão – a segunda que Froid explica – para termos perdido a Copa em casa, podemos debitar na conta da mídia esportiva nacional, capitaneada pela Rede Globo de Televisão. A contusão de Neymar foi supervalorizada pelos jornalistas esportivos e, consequentemente, pela torcida. Muita gente deixou de acreditar. Ouvi e li muitos torcedores dizendo que sem Neymar nossas chances contra a Alemanha eram mínimas. Quando os demais 22 jogadores do grupo da seleção precisavam de um tufão de coragem e confiança, a Globo lançava a campanha #Força Neymar. Tudo bem que o garoto prodígio precisava de alento. Acabavam de lhe tirar a possibilidade de cravar o nome na história do futebol, mas ele tem muitos anos futuros para isso. Já para os outros 22 selecionados de Felipão, havia uma semana para decidir tudo. E ninguém lembrou deles. Pelo contrário. A potencialização do “estamos ferrados sem Neymar” fez com que acreditassem nisto também. Só isso pode explicar uma equipe com os melhores jogadores do país do futebol entrar tão abalada em campo a ponto de tomar 5 gols em 30 minutos, 4 deles em 9 rápidos minutos. Já tentaram colocar a culpa na imprensa por diversos acontecimentos neste país, geralmente sem nenhuma razão. Desta vez, no entanto, a imprensa esportiva potencializou o caos, fez com que a torcida entrasse n a onda (o que não é nada difícil) e atingiram como um míssel o psicológico do grupo de jogadores que vestiu a amarelinha. Deu no que deu.


Para finalizar, duas conclusões óbvias. Primeira: o mundo dos brasileiros não acabou. Futebol é só futebol. Importante como entretenimento, mas não coloca a comida em nossa mesa. Segunda: o Brasil confirmou que seriedade e organização não são o forte dos seus governantes e do país. As obras de infraestrutura – o legado da Copa – não ficaram prontas. Muitas nem saíram do papel. Os estádios foram construídos às custas dos nossos impostos, inclusive em lugares que serão subutilizados, se é que serão, caso mais do que claro do mega-estádio construído no Amazonas. Quanto ao futebol, continuará o mesmo. O Brasil, maior celeiro de jogadores do mundo, seguirá confiando na improvisação e nos ‘Sassás Mutemas’ da vida. O modo de ser está arraigado na cultura brasileira, logo, na cultura do futebol brasileiro também. Planejamento, determinação e resultados que não sejam a curto prazo, não estão no DNA do país. Infelizmente.



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